segunda-feira, 5 de maio de 2008

Auxílio à lista, boa noite?

- Auxílio à lista, Luciana, boa noite, como posso ajudar?

- Luciana, me ajuda... Olha... Tô muito na merda, mergulhei de cabeça na fossa. Eu olho em volta e vejo tudo marrom. Mas marrom mesmo. Ontem mesmo eu vi a Alcione na minha janela. Já passou por isso?

- Auxílio à lista, Luciana, boa noite, como posso ajudar?

- Alooouu, tá ocupada demais segurando o pau mole e ensebado do seu chefe, é isso? Me ouve, porra. Tô na depressão aqui, preciso de alguém pra conversar. Vai lavar essa sua mão e me pergunta sobre a minha vida.

- Ahnnn...Auxílio à lista, Luciana, boa noite, como está a sua vida?

- Uma merda, Luciana, uma grande merda. Você não sabe como eu ando me sentindo. Já tentei até suicídio semana passada. Eu ia pular de um grande prédio e me espatifar contra o chão. Só que eu tenho medo de altura, sabe? Então eu fiquei me atirando de cima da minha escrivaninha, caindo no carpete. Pulei umas trinta vezes e só consegui arranjar uma luxação no traseiro.

- Mas senhor, por que você queria se matar?

- Bem, isso é porque eu me considero uma pessoa inferior. Andei lendo um livro de auto-ajuda, um tal de "Você é foda!", e até que ele me ajudou durante um tempo. Aluguei um carrinho de pamonhas e passei a ficar dando voltas pelo meu bairro gritando "eu sou foda!" pelo alto-falante do carro. As pessoas me apontavam na rua e diziam "olha, ele é foda". Daí uns carinhas que se achavam foda também começaram a me seguir e eu passei a andar em grupo. A gente circulava pela rua procurando pessoas estranhas. "Olha, um albino! Ele não é foda". Nisso corríamos atrás do cara com uns pedaços de pau cheios de prego.

- Nossa, eu sei como é isso, eu te entendo! Eu... eu esfaqueei minha irmã porque ela usava umas dessas pochetes fosforescentes na cintura e isso me constrangia. Preciso confessar... Eu retalhei o corpo dela, escondi no freezer e...

- Aloouu, boa-noite, Luciaanaa?! Essa daqui não é a história da sua vida, bosta. Você tá aí olhando pro seu próprio umbigo, contando esses causos de família e eu aqui na depressão. Dá pra me ouvir?

- Sim, claro. Lamentamos o incômodo, senhor.

- Tá. Mas aí, então, eu tava andando com essa turma pela rua, procurando pessoas estranhas, até que encontrei esse deficiente físico. Sabe uns sujeitos-cotocos, que nascem sem pé nem mão e se deslocam em cima do skate? Pois é, o cara tava nessa situação. Só que ele era casado, tinha uma mulher bonita, uns filhos criados. Parece que o cotoco conseguiu também um emprego bacana, como marketing regional manager na Coca-Cola. Alguém me contou que pra escrever um documento no Word ele ficava batendo com o nariz no teclado, que nem um frango. Só pedia ajuda pros outros na hora do control alt del. Mesmo assim o cotoco já tinha sido promovido várias vezes. E isso voltou a me deprimir totalmente. Eu odeio essas porras, sabe? Deficientes físicos que te dão uma lição de vida. Pro inferno com todos eles!

- Senhor, por falar em inferno, posso continuar com minha história?

- Não.

- Perfeitamente, isso não voltará a se repetir.

- Mas voltando: depois de me afundar outra vez na depressão eu resolvi viajar para bem longe. Fui pro campo, onde você pode ver à noite o céu todo estrelado. Daí eu vi uma estrela cadente e, logo depois, vi mais outras duas. Aproveitei para fazer um pedido: não queria mais ver estrelas cadentes. Voltei pra cidade grande e, como eu não tenho amigos, resolvi ligar hoje para você.

- Nós agradecemos a sua preferência, senhor.

- Nós quem? Você e o chefe do pau ensebado?

- Não. Nós, a empresa.

- Ah, sim, foi só por perguntar.